quarta-feira, março 23, 2011

Matrix

Um breve devaneio sobre Filosofia e a Virtualidade Real
Há mais de dez anos atrás o cinema receberia em suas telas um filme que revolucionaria a história da ficção científica de uma forma toda particular. Diferente das bigas de Ben-Hur e das lágrimas naufragantes de Titanic, Matrix chegou de forma anônima as telonas com a proposta de retratar de forma grandiosa, não o passado, mas o futuro. Sucesso instantâneo de público e crítica, o longa dos irmãos Wachowsky, garantiu à dupla de nome quase impronunciável, o sinal verde no orçamento para duas seqüências. Abusando dos efeitos especiais e da ação, as seqüências Reloaded e Revolutions, não chegam aos pés da obra original e acabaram enterrando a franquia em uma aura de “tudo aquilo que poderia ter sido e não foi”.
O filme original tem diversos pontos inovadores. A estética toda estilizada e os consagrados movimentos de câmera em slow-motion se tornaram marcas registradas e ícones referenciais no cinema. O grande trunfo que garantiu ao filme um caráter mítico está por trás do figurino, da fotografia e dos efeitos especiais que ambientam muito bem o público à proposta do longa. Matrix é antes de tudo um filme cerebral, o alicerce que justifica seus malabarismos técnicos é seu roteiro.

Urgente, preocupante e imediato; o fio condutor que guia a história tinha uma pergunta instigante e ameaçadora em suas entrelinhas. Poderia um dia o homem ser escravizado pela tecnologia que criou?

As máquinas de Matrix evoluíram ao ponto de dominar os seres humanos e aprisioná-los em casulos. No filme vivemos em uma realidade virtual, e através de impulsos eletrônicos em nossos cérebros, podemos sentir emoções e tristezas, tudo para que nossos corpos gerem calor para alimentar as máquinas. Como grandes usinas, apenas “funcionamos” e a vida que vivemos não existe realmente.

A profundidade da história fez com que o filme se tornasse uma aula de filosofia completa utilizada inclusive em sala de aula das grandes universidades do Brasil e do mundo. Eu mesmo durante a faculdade estudei um texto da autora Maria Helena Chauí, falando sobre o filme, em uma de minhas infindáveis aulas de filosofia.

Matrix atualizou depois de 31 anos a mesma temática de “2001 uma Odisséia no Espaço”, realizado em 1968. O clássico dirigido pela lenda do cinema Stanley Kubrick, se tornou a base estética para toda ficção científica que seria produzida desde então. Sua história de mistério girava em torno de um monólito negro e da evolução humana, em uma busca pelo desconhecido. Além do alto conteúdo filosófico presente nas entrelinhas, a narrativa principal também trazia a “revolta da tecnologia contra seu criador”, personificada no computador de bordo HAL 2000 da nave Discovery, que após uma pane assume o controle e começa a eliminar seus tripulantes.

O impacto de Matrix, portanto, não vem necessariamente de sua originalidade, mas de seu tempo. 2001 Uma .... era claramente uma ficção, em uma época onde computadores tinham o tamanho de imensas salas e serviam ainda apenas para resolver cálculos básicos - sua temática não era ameaçadora. 

Quando a história do hacker Neo, uma espécie de messias virtual, chega até nós em 1999, estamos diante da revolução tecnológica proporcionada pelos computadores que se tornavam menores e mais eficientes a cada ano, encurtavam distâncias, armazenavam e distribuíam informações em disquetes, cds e discos rígidos, jogavam xadrez e superavam a mente humana.

Hoje, mais de dez anos depois, somos ainda mais dependentes das tecnologias que criamos. O computador aos poucos assume o centro das casas, ficando responsável pelo entretenimento, pela informação e pelo lazer de seus habitantes. A cultura que foi revolucionada com o papiro, hoje vê o fim de sua existência real e palpável. Grandes jornais e revistas estão migrando para o meio virtual e deixando de existir no mundo real assim como muitas coisas comuns de nosso dia-a-dia. Estamos diante de uma tendência preocupante: músicas, filmes, livros estão perdendo sua existência concreta e “virando” bytes armazenados em um disco. Você mesmo que lê agora este artigo optou pela Internet neste instante como fonte de notícias e conhecimento. Será que paramos para pensar que talvez estejamos caminhando para uma virtualização da realidade ?

Amigos virtuais, conversas virtuais, jogos virtuais, e até vidas virtuais( anunciadas inclusive com o nome bastante coerente de “Second Life”) estão “roubando” nosso tempo que antes era gasto com interações reais.

Estamos diante talvez de um salto evolutivo da espécie, estamos migrando para outro ambiente. Semelhanças com a história de Matrix ?

Em pesquisa realizada na época de lançamento do filme, 15% dos entrevistados disseram acreditar que existe a possibilidade, de nesse momento, estarmos vivendo a realidade proposta pelo filme.

Sem a pretensão de ser a trombeta digital do anjo do apocalipse moderno não vejo com bons olhos nosso fascínio pelo mundo virtual que criamos, pela tecnologia sem limites que encurta distâncias e resolve nossos problemas por nós. E se alguém um dia puxar o plugue da tomada? Estaremos de volta a era do fogo com paus e pedras?

O grande triunfo de “Matrix” é ser mais que um filme. É gerar uma inumerável gama de assuntos urgentes para reflexão e oferecer ao espectador atento um bom motivo para questionar as diferenças entre a vida real e a vida virtual que se vive atualmente.

O próximo passo que já está sendo dado em direção ao novo advento da tecnologia são as pesquisas relacionadas a inteligência artificial. Não sei se daqui a dez anos estarei escrevendo sobre ciborgues, andróides e híbridos, ou se confortavelmente eles estarão escrevendo por mim, se como em Matrix receberemos diretamente através de agulhas pontiagudas espetadas em nosso cérebro as informações diárias que precisamos, mas ainda sinto uma reconfortante sensação de poder ao puxar o plugue do computador e em uma atitude de rebeldia contemporânea abrir um bom e velho livro de papel. Ainda estamos no comando, pelo menos por enquanto.... 

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